sábado, 2 de agosto de 2008

Capítulo Desnecessário

FIM 02

Capítulo desnecessário – O DIA SEGUINTE

Durante duas semanas, o casal andou de um lado para outro em passeios por toda a cidade. Experimentaram a aventura da noite, bares, boates, restaurantes, motéis, centro comerciais, cinemas e novos amigos. Compravam roupas de bebê sempre que passavam por uma loja de artigos infantis.
Resolveram marcar logo o casamento, enquanto Joaquim cuidava da parte legal junto ao conselho de medicina para que Agamenon retornasse a sua profissão. Fausto não cabia em si com a noticia que seria avô, contava para todos que passavam a sua frente.
O dinheiro estava acabando no bolso do médico que preocupado foi aconselhado por Heloisa a ir até o banco ver se havia alguma coisa no cofre onde deixara as jóias e ações que comprara. Para ele, era tempo perdido, deveria ter feito parte do inventário, mas resolveu arriscar.
Uma manhã, depois de muito refletir, vestiu-se decidido, acabaria com qualquer duvida sobre o assunto, ela queria acompanhá-lo, mas ele preferia ir só. Pegou a chave do cofre na sua maleta de mão, colocou no bolso e saiu ansioso.
O prédio do antigo banco havia sido reformado, mas ainda era uma agencia bancaria. Entrou olhando as mudanças a sua volta, maquinas onde pessoas se serviam de dinheiro por todos os lados, um pequeno balcão, uma bateria com dez caixas, sendo que apenas em dois havia atendimento. Foi diretamente até um homem sentado num canto com uma placa sobre a mesa onde se lia “GERENTE”.
- Bom dia!
- Em que posso ajudá-lo – disse o gerente com ares de formalidade.
- Tenho uma caixa forte aqui no banco e gostaria de retirar os pertences depositados.
- O nome do senhor?
- Agamenon Lanufo.
O homem se voltou para um computador ao lado, digitou alguma coisa ficou um tempo esperando e em seguida com expressão de duvida perguntou com o olhar grudado na tela.
- Qual o número de sua caixa forte?
- Um minutinho! - Agamenon pegou a chave no bolso e leu o numero gravado – Está aqui, 20045.
- Correto, cofre antigo! Tem identidade?
- Claro! – Agamenon puxou a carteira de identidade e uma cópia da publicação de sentença no Diário Oficial.
O Gerente parecia assustado, leu varias vezes e dando de ombros fez sinal para que Agamenon o acompanhasse. Entraram por um corredor estreito, desceram uma escada e logo estavam diante de uma porta de aço. Outro homem sentado numa carteira mais a frente se levantou com preguiça e veio atender. O gerente que mandou abrir a porta enquanto Agamenon sentia as pernas fraquejarem.
Durante a manhã inteira, Heloisa parecia não encontrar lugar onde se acomodar, estava excitada com a possibilidade de uma noticia ruim e isso era o suficiente para ficar preocupada com seu homem. Fausto já tentara acalmá-la dizendo que Agamenon poderia trabalhar no hotel enquanto não fosse possível clinicar. Nada a fazia ficar tranqüila, sabia que Agamenon poderia aceitar a oferta de seu pai, mas no fundo não iria sentir-se bem.
Ao ver Agamenon entrar no hotel, correu para ele o abraçando com muita força. Ele sorriu de maneira lacônica. Ela o olhou angustiada implorando noticias.
- Estamos ricos! – Agamenon limpou com as costas da mão uma sujeira invisível sobre a camisa.
- Como assim?
- As jóias estão valendo uma fortuna. As ações que comprei, estão super valorizadas e ainda tenho dinheiro na conta, os dividendos que a empresa depositou todos esses anos em meu nome, já que sou sócio de uma das maiores empresas do país.
- Graças a Deus! Agora você fica mais tranqüilo, pra esperar o conselho de Medicina.
- Vou comprar uma casa...
- Vá com calma, primeiro vamos casar. Depois compra ... casa não, prefiro um apartamento.

Durante dois dias, Joaquim não havia aparecido nem telefonado. Vicente também parecia ter sumido. Agamenon comentou com Fausto que lhe disse que os dois eram assim mesmo. Heloisa vendo que o médico estava preocupado, telefonou para o tio que informou estar muito ocupado e que no dia seguinte teria uma decisão do Conselho de Medicina.
- Passo ai, logo depois do almoço!
A moça desligou o telefone com ar preocupado, se o tio estava fazendo tanto mistério, a coisa devia ser ruim para Agamenon, ela preferiu não comentar nada com ele, deixar que no dia seguinte, o tio fizesse a comunicação. Ela acreditava não valer a pena antecipar a angustia do médico.
Durante toda à noite, ela fritou de um lado para o outro da cama, sem conseguir dormir. Olhava para Agamenon ao seu lado, acariciava a barriga, tentava matar uma muriçoca que cantava incomodativa ao seu ouvido enquanto seus pensamentos corriam de um lado para o outro.
Imaginava os médicos negando o retorno de seu amado ao mundo profissional. De certa forma, ela sentia culpa por ele ter ficado ali, não ter regressado ao seu tempo e por isso pensava a todo instante, “Ele não vai conseguir viver feliz, sem ser médico”.
Naquela manhã, Heloisa acordou angustiada, sentia náuseas e vomitava a todo instante. Tentou esconder o que realmente sentia se desculpando na gravidez. Agamenon saiu logo cedo, como de hábito, para ir até a Biblioteca Publica ficar lendo as publicações recentes de livros e revistas médicas tentando se atualizar. A moça angustiada ficou no hotel impaciente olhando os minutos se arrastarem. Para piorar sua situação, o pai lhe confidenciou em tom de desabafo a situação econômica ruim do hotel.
- Estamos no limite! Se continuar assim, dentro de um ano no Maximo, estaremos fechando as portas. O centro da cidade não suporta mais um hotel desse tipo!
- Tenha calma, papai, vamos encontrar uma solução!
- Já tentei de tudo, não vou transformar esse hotel em uma pousada de rotatividade, alugar quartos para casais por hora.
- Tem de haver uma coisa que se faça para evitar essa situação.
- Tem! A única que posso imaginar! Vender o prédio como fez o pai de Norma com o cinema. Isso... se conseguir quem queira.
Pouco antes das onze horas, o telefone tocou e Fausto atendeu. Depois de falar por algum tempo, desligou se voltando para a filha que arrumava as revistas sobre as mesas na recepção.
- Filha! Joaquim disse para avisar ao Agamenon que vista um terno. Ele passa aqui por volta das duas da tarde. Vão até o Conselho de Medicina.
- Fazer o quê? – Ela perguntou sentindo a voz esmagada na garganta.
- Sei lá! Deve se sobre a decisão.
Assim que Agamenon entrou no hotel, pouco antes do almoço ela mesma deu o recado que seu tio deixara. Agamenon também ficou excitado e quase nem conseguiu comer, mas não poderia se deixar nessa situação, sabia que preferia uma noticia ruim ao desconforto da indecisão.
A angustia de Heloisa só fazia aumentar. Prolongou-se pela tarde inteira já que não sabia o que estava acontecendo. Tentou acompanhar o tio e Agamenon, de maneira insistente, Joaquim não permitiu, assim, só lhe restava ficar aguardando com o coração sobressaltado.
Por volta das sete horas da noite, Agamenon chegou com Joaquim ela respirou aliviada ao ver expressão de satisfação nos dois. Joaquim contou que a decisão do conselho havia sido satisfatória, haviam condicionado o retorno de Agamenon para a profissão, a uma residência de especialização de seis meses, acompanhado por uma junta de três médicos em hospitais diferentes.
Alegres, resolveram comemorar com um jantar em um restaurante a beira mar, onde havia uma pista de dança. Todos pareciam felizes, menos Fausto que preferiu ficar no hotel fazendo a contabilidade. Durante o jantar, Agamenon perguntou o que tanto parecia angustiar o pai da moça.
- Ele está mal com a situação financeira do hotel. Acha que vai ter de vender!
- Tenho pensado algumas coisas e você me dizendo isso, acho que vou conversar com Fausto.
- Posso saber o que tem ai dentro? – Heloisa tentou sorrir dando umas batidinhas com os nós dos dedos, na cabeça do namorado.
- Estive hoje conversando com alguns membros do conselho antes da audiência, eles apontaram para mim uma grande idéia. Uma clínica Geriátrica. Acho que vou me especializar por ai, sempre me pareceu muito interessante.
- E o que isso tem a ver com papai?
- O hotel! Tem uma localização ideal para uma clinica assim, no centro, onde a maioria dos idosos chega facilmente de ônibus, as instalações amplas e...
- Não sei...
- Veja pelo lado bom. Um hotel se parece com um hospital, só que com finalidades diferentes.
- O estacionamento é pequeno!
- Já pensei nisso, tem o sobrado ao lado, está abandonado, caindo aos pedaços.
- Acho que têm uma questão na justiça, herdeiros brigando...
- Isso não vai ser problema pra Joaquim! Ele que resolva.
- Você não vai ter dinheiro...
- Ainda nem comecei e você já está me endividando!
- Quem começou a gastar foi você com essa sua idéia...
- Vamos deixar esse assunto pra depois. Vamos dançar?
Aproveitando uma musica suave que está tocando, Agamenon vai com Heloisa para a pista de dança onde há apenas dois casais dançando, eles se abraçam com paixão, se olham demoradamente enquanto dançam. Uma banda trajada a rigor, parece adivinhar e assim que acabam o que estão executando, inicia uma canção dos anos cinqüenta. Agamenon deita a cabeça no ombro de Heloisa, que o abraça. Os dois rompem em lagrimas continuando a dançar.
As luzes do restaurante se apagam permanecendo apenas o refletor do cento da pista de dança, com uma luz azul muito forte. Uma névoa de fumaça começa a envolver os dançarinos rapidamente e quando quase não se consegue enxergá-los, ouve-se alguém batendo palmas fortes e uma voz silenciando tudo.

- COORTA!

As luzes voltam a serem acesas enquanto as pessoas das mesas começam a levantar sorridentes, se abraçando. Norma sai do meio deles e vem ao encontro do homem que gritou e de longe lhe acena chamando com uma mão levantada e na outra um maço grosso de papel encadernado, que joga sobre uma cadeira de fechar com a palavra DIRETOR escrita no pano de encosto.
- Roteirista...! – Ele sorriu ao ver Norma bem próxima. – Parabéns mocinha!

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